Novamente, voltamos ao tema da tradução do Sagrado Alcorão ao vernáculo, com a clareza de que o Livro Evidente deve ser lido sempre no original, em árabe clássico.
É com inteira razão que Rafael Cansinos Assens, no prólogo à sua versão em espanhol do Nobre Alcorão (Madrid, Aguilar, 1951, página 31), afirma que não somente nenhuma das traduções alcorânicas é perfeita como é impossível que alguma o seja nunca.
É com inteira razão que Rafael Cansinos Assens, no prólogo à sua versão em espanhol do Nobre Alcorão (Madrid, Aguilar, 1951, página 31), afirma que não somente nenhuma das traduções alcorânicas é perfeita como é impossível que alguma o seja nunca.
E acrescenta: "El Korán, aún más que los grandes libros clásicos latinos y griegos, es, por el tono de su inspiración y la índole particular de su lengua, un libro que nunca podrá verterse a otro idioma en un molde perfecto."
Assim, numa modesta tentativa de levantamento das edições em português, consultamos as referências bibliográficas disponíveis (vide as fontes, ao final) para listarmos as traduções em ordem cronológica de publicação e chegarmos, quiçá, à primeira delas.
Na introdução à sua erudita tradução ao português do Nobre Alcorão (2ª edição, Lisboa, 1980, páginas 4-7), o Professor José Pedro Machado faz um inventário de manuscritos inéditos do Alcorão em bibliotecas portuguesas, com os seguintes resultados:
● Biblioteca Nacional de Lisboa:
- Manuscrito 1-P-5-20: Extractos do Alcorão.
- Manuscrito 3-Y-4-57: Alcorão, acabado de copiar no mês de Sha'aban do ano 1011 da Hégira (janeiro de 1603).
● Biblioteca de Évora:
- Manuscrito 5-Códice CXVI/1-40: Exemplar escrito em belos caracteres magrebinos a preto, vocalização a encarnado, mas os outros sinais auxiliares a verde, excepto a pontuação e o u indeterminado ou adverbial, que são a amarelo. Contém 64 folhas de texto em excelente papel calandrado e mais 4 de guarda. Al Korano, com versículos das suras 86 e 87 e a sura 4. Com explicações em latim, parece ter usado como referência a tradução inglesa de George Sale, cuja primeira edição ocorreu em 1734.
● Biblioteca da Academia de Ciências de Lisboa:
- Manuscrito 6-Manuscrito nº 435: Códice encadernado, de folhas não numeradas. O título das suras e a separação dos versículos são a encarnado. Caligrafia magrebina bastante legível. Trata-se de um exemplar do Alcorão encontrado em uma "preza" que se fez no Mediterrâneo (notícia de 1825).
Nenhum dos manuscritos acima, como se pode presumir, constitui uma tradução ao idioma português do Nobre Alcorão.
A princípio, pudemos então levantar, em ordem cronológica, as traduções ao português do Nobre Alcorão, segundo a data da primeira edição:
– Traduções parciais:
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- Manuscrito 3-Y-4-57: Alcorão, acabado de copiar no mês de Sha'aban do ano 1011 da Hégira (janeiro de 1603).
● Biblioteca de Évora:
- Manuscrito 5-Códice CXVI/1-40: Exemplar escrito em belos caracteres magrebinos a preto, vocalização a encarnado, mas os outros sinais auxiliares a verde, excepto a pontuação e o u indeterminado ou adverbial, que são a amarelo. Contém 64 folhas de texto em excelente papel calandrado e mais 4 de guarda. Al Korano, com versículos das suras 86 e 87 e a sura 4. Com explicações em latim, parece ter usado como referência a tradução inglesa de George Sale, cuja primeira edição ocorreu em 1734.
● Biblioteca da Academia de Ciências de Lisboa:
- Manuscrito 6-Manuscrito nº 435: Códice encadernado, de folhas não numeradas. O título das suras e a separação dos versículos são a encarnado. Caligrafia magrebina bastante legível. Trata-se de um exemplar do Alcorão encontrado em uma "preza" que se fez no Mediterrâneo (notícia de 1825).
Nenhum dos manuscritos acima, como se pode presumir, constitui uma tradução ao idioma português do Nobre Alcorão.
A princípio, pudemos então levantar, em ordem cronológica, as traduções ao português do Nobre Alcorão, segundo a data da primeira edição:
– Traduções parciais:
- 1942 - Jamil Almansur Haddad (muçulmano).
- 1943 - Agostinho da Silva (cristão católico?).
- 1970 - F. Abu Iúçuf, pseudônimo literário de Francisco José Velozo (cristão católico?).
- 1971 - Suleiman Valy Mamede (muçulmano).
– Traduções completas:
Parece-nos bastante plausível a suposição de que as edições referidas por Hamidullah sejam a mesma.
De sua parte, Míkel de Epalza, na obra El Corán y sus traducciones: propuestas (Universidad de Alicante, 2008, página 116), enumera duas traduções anônimas ao português na sua lista. A primeira seria de um tradutor anônimo português, de 1882, uma edição impressa na França. E Epalza acrescenta, citando Sidarus [ou seja, Adel Sidarus, em Nota Sobre as Traduções Portuguesas do Corão, in: Revista Qurtuba, Córdoba, volume 5, 2000, páginas 277-280]: "Exemplar não consultado. Informação da BN da França. Haverá qualquer ligação com a versão francesa publicada no ano seguinte (reimpressão 1923) por Garnier Frères, sob o título Le Koran. Précédé d'un abrégé de la vie de Mahomet [x-533p.]". Se assim for, este tradutor anônimo português teria feito a sua a partir da tradução francesa de Claude-Étienne Savary, a qual é efetivamente precedida por um resumo da vida do Profeta Muhammad (saas).
A segunda tradução, ainda segundo Míkel de Epalza, seria de um tradutor anônimo brasileiro, "sem ano de edição, mas parece que do século XX".
Por fim, as três notícias bibliográficas que tendem a confirmar a data da edição brasileira foram encontradas nos catálogos da Biblioteca Nacional do Brasil, da Biblioteca Nacional da França e do Système Universitaire de Documentation (Sudoc) da França. A primeira, no catálogo antigo de obras raras da BN do Brasil, possui a seguinte descrição: Alcorão, Traducção portugueza cuidadosamente revista, Rio de Janeiro, B.L. Garnier, 1882, 553 páginas. A segunda, no catálogo da BN da França, confirma integralmente a descrição anterior. E a terceira, no catálogo do Sudoc, ratifica as notícias dos dois outros catálogos e detalha mais a informação, segundo a qual houve uma edição múltipla desta tradução no ano de 1882, a saber: no Rio de Janeiro (B.-L. Garnier), em Paris (E. Belhutte) e em Lisboa (Bertrand). E completa: "P. de titre en arabe en regard de la p. de titre. - Daté d'après le timbre du d.l."
- 1961 - Nagib Modad (druso).
- 1964 - Bento de Castro, pseudônimo de Constantino de Castro Lopo (cristão católico?).
- 1974 - Samir El Hayek (muçulmano).
- 1978 - Américo de Carvalho (cristão católico?).
- 1979 - José Pedro Machado (cristão católico?).
- 1980 - Mansour Challita (cristão maronita).
- 1988 - Iqbal Ahmad Najam e Edelweiss de Almeida Dias (ahmadia).
- 1991 - Youssuf Adamgy (muçulmano).
- 2005 - Helmi Nasr (muçulmano).
Parece-nos bastante plausível a suposição de que as edições referidas por Hamidullah sejam a mesma.
De sua parte, Míkel de Epalza, na obra El Corán y sus traducciones: propuestas (Universidad de Alicante, 2008, página 116), enumera duas traduções anônimas ao português na sua lista. A primeira seria de um tradutor anônimo português, de 1882, uma edição impressa na França. E Epalza acrescenta, citando Sidarus [ou seja, Adel Sidarus, em Nota Sobre as Traduções Portuguesas do Corão, in: Revista Qurtuba, Córdoba, volume 5, 2000, páginas 277-280]: "Exemplar não consultado. Informação da BN da França. Haverá qualquer ligação com a versão francesa publicada no ano seguinte (reimpressão 1923) por Garnier Frères, sob o título Le Koran. Précédé d'un abrégé de la vie de Mahomet [x-533p.]". Se assim for, este tradutor anônimo português teria feito a sua a partir da tradução francesa de Claude-Étienne Savary, a qual é efetivamente precedida por um resumo da vida do Profeta Muhammad (saas).
A segunda tradução, ainda segundo Míkel de Epalza, seria de um tradutor anônimo brasileiro, "sem ano de edição, mas parece que do século XX".
Por fim, as três notícias bibliográficas que tendem a confirmar a data da edição brasileira foram encontradas nos catálogos da Biblioteca Nacional do Brasil, da Biblioteca Nacional da França e do Système Universitaire de Documentation (Sudoc) da França. A primeira, no catálogo antigo de obras raras da BN do Brasil, possui a seguinte descrição: Alcorão, Traducção portugueza cuidadosamente revista, Rio de Janeiro, B.L. Garnier, 1882, 553 páginas. A segunda, no catálogo da BN da França, confirma integralmente a descrição anterior. E a terceira, no catálogo do Sudoc, ratifica as notícias dos dois outros catálogos e detalha mais a informação, segundo a qual houve uma edição múltipla desta tradução no ano de 1882, a saber: no Rio de Janeiro (B.-L. Garnier), em Paris (E. Belhutte) e em Lisboa (Bertrand). E completa: "P. de titre en arabe en regard de la p. de titre. - Daté d'après le timbre du d.l."
Portanto, ainda que não haja elementos definitivamente conclusivos, pois não podemos afirmar se seria um tradutor anônimo português ou se seria brasileiro (ou de outro país lusófono), ou ainda se seria uma retradução (ou não) da versão francesa de Savary (sem o resumo da vida do Profeta), não obstante isso, é categórico que a edição, cuja capa e folha de rosto apresentamos abaixo, é de 1882 e constitui a primeira tradução completa ao vernáculo português do Nobre Alcorão, de que se tem notícia.
Allahu Áalam.
Allah sabe melhor.
Allahu Áalam.
Allah sabe melhor.
Anônimo - 1882
Alcorão - Tradutor Anônimo - 1882 (capa) |
Alcorão - Tradutor Anônimo - 1882 (rosto) |
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FONTES:
1. José Pedro Machado. Alcorão. 2ª edição, Lisboa, Junta de Investigações Científicas do Ultramar, 1980, páginas 4-7
2. Muhammad Hamidullah. Le Saint Coran. 12ª edição. Paris, Maison d'Ennour, 1406 (1986).
3. Míkel de Epalza, Josep Forcadell y Joan Perujo. El Corán y sus traducciones: propuestas. Alicante, Universidad de Alicante, 2008, páginas 115-117. [1]
4. Adel Sidarus. Nota Sobre as Traduções Portuguesas do Corão. In: Revista Qurtuba - estudios andalusíes, Córdoba, vol. 5 (2000), pp. 277-280.
5. Abdoolkarim Vakil. Do Outro ao Diverso - Islão e Muçulmanos em Portugal: história, discursos, identidades. In: Revista Lusófona de Ciência das Religiões, Lisboa, Ano III (2004), n.º 5-6, pp. 283-312. [2]
5. Abdoolkarim Vakil. Do Outro ao Diverso - Islão e Muçulmanos em Portugal: história, discursos, identidades. In: Revista Lusófona de Ciência das Religiões, Lisboa, Ano III (2004), n.º 5-6, pp. 283-312. [2]
6. İsmet Bi̇nark, Halit Eren, Ekmeleddin İhsanoğlu. World bibliography of translations of the meanings of
the Holy Quran - printed translations: 1515-1980. Istambul, Research Centre for Islamic History, Art and Culture, 1406 (1986), 880 p. [3]
7. Catálogo antigo de obras raras da Biblioteca Nacional do Brasil. [4]
8. Catálogo da Biblioteca Nacional da França. [5]
9. Catálogo do Système Universitaire de Documentation (Sudoc) da França. [6]
7. Catálogo antigo de obras raras da Biblioteca Nacional do Brasil. [4]
8. Catálogo da Biblioteca Nacional da França. [5]
9. Catálogo do Système Universitaire de Documentation (Sudoc) da França. [6]
Muito enriquecedora essa matéria! As informações sobre o Islam em língua portuguesa são tão raras, que me encantam cada vez que eu encontro. Assalamu Aleikom e que Allah SW continue abençoando meu querido irmão. Meu novo email: hajj.hamza@gmail.com
ResponderExcluirPrezado Hamza: Foi um trabalho de pesquisa de oito meses, mas o Altíssimo nos auxiliou. Uma obra muito boa, em português, sobre o Alcorão e os Ahadith, publicada em Moçambique, para download:
Excluirhttp://www.sautulisslam.com/index.php/content/download/583/4609/file/HQHB.pdf
Quantas mesquitas ha no estado do Parana!?
ResponderExcluirVide neste link: https://islamparana.blogspot.com.br/p/mesquitas-do-parana.html
ExcluirA primeira tradução directa do Alcorão para Português de José Pedro Machado, é de 1979.
ResponderExcluirPrezada irmã, a primeira tradução do Nobre Alcorão no século 20 é de Nagib Modad, de 1961. A erudita tradução do Prof. José Pedro Machado é de 1979; posterior, portanto.
ExcluirA tradução de que tratamos no artigo acima pertence ao século 19, do ano de 1882.